Um vazio que se completa na oposta sensação de transbordar, como fosse essa chuva que nos despreza inundando tudo. É como perder, outra vez, alguma coisa que sempre nos faltou e, enfim, nem saber que algo é esse que se perdeu. A raiva triangulada com uma tristeza vertiginosa e essa esperança adocicada que só gera comoção. O tédio, o cansaço, a ideia carrancuda de que o tempo pode mesmo ser mensurado com pele, músculo, sangue e osso. A respiração ofegante contida numa risada embriagada, cheia de vontade de sobrevoar a costa e o milharal, como fosse uma ou outra ancestral bruxólica, daquelas mulheres que lavavam roupas nas fontes d'água e pilotavam vassouras sob o céu. É quase como abstinência: precisa resistir às primeiras horas e aos dias seguintes e deixar que tudo se mova lenta e ordinariamente. O sentimento racionalizado só radicaliza a fantasia. Viver é preciso, mesmo que já tenhamos chegado ao fim. Mudar a ideia, a rota e as certezas, mesmo que o medo seja a alavanca de uma vida inteira.


Comments fornecido por CComment