eu queria ser surfista, a mãe disse que não era profissão, aí queria ser dançarina, ela achou meio absurdo, eu queria ir embora com o circo, mas ao cabo de toda a controvérsia, eu não podia decepcionar a mãe, então sempre estudo mais um pouquinho pra fazer qualquer coisa. enfim, não sei muitas coisas, apenas que, às vezes, as mães são esse poço de insatisfação, escondidas atrás de um livro (ou de um tweet cheio de positividade tóxica). uma força da natureza, amar a mãe é incontrolável e original demais. sobrepõe a arte e o corpo, não consigo evitar. quem é a mãe, afinal?

~setembro de 2022~

a menina
a mulher
a mãe

a mulher
depois da mãe
a mãe
depois da mãe

a mãe
a mulher
a menina

~março de 2015~

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o riso é contingente da raiva

a raiva na contenção da tristeza

a tristeza contida na falta

que comprime o desejo.

um vulto torto

parado na esquina

eu posso ver aqui da janela. 

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Fui tola. Demorei pra ver o que, de fato, aconteceria. A ingenuidade, ao menos, não antecipou o terror vivido nos últimos quatro anos. Autoestima diluída em cada tom de ameaça. Todo dia, uma violência contra tudo que foi inevitável me tornar: jornalista, de esquerda, feminista. Trabalhar em sindicatos. Testemunhar o que sobrou deles. Morar sozinha com uma menina numa região da cidade onde a polícia se excede. Suspeitar do vizinho, do colega, da pessoa na fila do terminal. Crise econômica, perda de direitos trabalhistas, emergência sanitária. Manter o emprego, mas ficar sem trabalho. Medo de não ter pra onde ir.

Acredito na chance de um horizonte possível depois de tudo isso. Mas, não sem desconfiar.

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entre o olho e a mira

sempre tem mais uma camada

como fosse uma película de sal

enterrada tal qual o vidro na carne.

as dermes incrustadas umas nas outras

atravessadas pelo que (nem) sabem sobre si.

linha fosca margeando

um trajeto úmido

praquilo que não tinha a ver até agora.

músculo, sangue, nervos,

tédio, desilusão, brutalidade.

se aproximar de qualquer coisa

é o jeito mais óbvio de se implicar com isso.

a descoberta altera, mas repete, o ciclo da estranheza: o deleite da nudez. 

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