"A loucura é o ápice da consciência". Foi uma frase que eu ouvi não sei de quem e sei lá se alguém escreveu isso mesmo. Mas, eu acho que a frase é boa porque favorece a palavra loucura. Dá a ela algo a mais do que uma referência original de sentido. Acho que o louco, no ápice da consciência, é alguém que antevê algo ou que atravessa essa sensatez falsa e convencional dos cheios de "bom senso". O louco enfrenta o tédio e a ilusão. Radicaliza no corpo e na ação qualquer sentido da palavra antes que ela seja. É quem se conecta mais habilidosamente com essa linha sutil que envolve qualquer ato ou qualquer discurso consolidado. O louco como um ente que atravessa uma linguagem qualquer, sem valorá-la ou se submeter a ela, ao mesmo tempo que lhe entrega tudo: corpo, mentalidade, espírito, singularidade. O louco é quase mediúnico, não porque é religioso, mas pela sua capacidade de mediar o tempo e ampliar o sentido das palavras até que elas deixem de significar tanto e passem a ser só elas mesmas. É como estar num nevoeiro e se deixar levar pelo medo, pela angustia, pela proporção que toma qualquer sentimento. A loucura é a consciência reivindicando a sua própria perda de sentido.

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a graça

o choro

a divisão silábica

tudo que tangenciar

o pensamento 

absorto pela lástima

é um alívio

quase um grito de

espanto espasmo

um soluço um gemido

alguma coisa que atravesse

esse minuto a minuto

de dor de cabeça

e preguiça de sair do lugar

a histeria tomou conta de tudo

a casa o trabalho

o espírito torto na esquina do quarto.

aguardar o fim é sempre mais alucinante

do que a hora em que tudo acaba de vez.

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Uma coisa que eu acho bem bonita (e inteligente) é quando aceitamos suportar linguagens que não são as nossas de conforto para que seja possível viabilizar uma interlocução. Se entregar a isso parece ser um esforço muito sutil e delicado, como também é uma possibilidade e tanto de se conectar ao outro. Um desembarque numa linguagem qualquer, sem juízo de valor e coisa e tal, em que respeitamos suas próprias dinâmicas. Essencialmente um movimento de ouvir mais do que tudo. Algo como oferecer o corpo à experiência: se deixar levar por algo estranho - que não se sabe o que é ou que até preferimos refutar - para vê-lo de bem perto. Não como um movimento exploratório, mas contemplativo, em que seja possível uma interlocução menos ruidosa; um lugar de encontro que nos junte outra vez.

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quando tudo flutua,

parece bom mas dá angústia.

é a hora, enfim, de aceitar

ser só esse corpo

que flutua e que geme.

é como esquecer de existir: 

ser só pele, músculo, nervo e osso, 

em queda livre,

bem perto de deixar de ser alguma coisa.

 

o abismo na beira é quando tudo flutua.

parece angustiante, mas é bom.

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