sempre voltamos atrás: não tente negar. sempre voltamos a algum ponto de dor, dúvida, amor... e nem se sabe disso, mas é amor. um eterno ir e vir sem pena ou perdão, simples assim - ver-se como nunca antes. azul, vermelho, amarelo, rosa, verde, lilás. tanta significância sem significado. o cansaço é geral e nem dá pra pedir pelo amor deus. uma película bem fininha, um filme que retém quem se era e ainda é ou o que será de nós porque ninguém é capaz de apagar tudo isso e seguir só. significa, relê, atualiza, pede para partir, mas apaga. uma fita, uma vela, um nome gravado que não se dispensa nem se sobrepõe. a igualdade que ignora o desejo de quem mata. dor e choro, calor e uma certa obstrução dessa passagem que nos carrega pelo tempo. o tempo vazado, desconexo e inevitável. ninguém se sobressai àquilo que não sabe, mas se faz ser. a linguagem é um avião em pleno voo próximo a colidir. quem cai, quem acorda depois do tombo? quem não se dá conta tem mais condições de suportar. cantar, sorver, gritar, morrer, verbos obedecendo a conjugação. o que é afinal conjugar? combinar, condizer, coincidir. ou julgar com o outro na falta do que fazer. sei lá, aceito o movimento e escrevo o que tenho vontade de cuspir. é insuportável a mais valia, a mitagem ou a autoexigência. a linguagem exacerbou, assim, bem banal, mas alegre, enquanto vamos dormir tristes, ou descrente, ou ainda com uma convicção obsoleta: não se sabe quem é quem e a miragem é de tumulto. uma flor despetalada antes de qualquer primavera.

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nada que se diga é coerente com a cabeça que se deita no travesseiro, atravessa a noite, sonha e ri, mas não se despede. o eterno retorno, como fosse uma maldição. o dia se repete e se repete e se repete: dormir, acordar, pressentir e nada acontecer. esperar é sempre uma desmotivação, um cálice seco calando o desejo submetido à regra, ao tédio, ao dessabor de habitar este tempo que, embora tenha nos dado muito, nos tira em dobro. o conserto da casa, a falha nos ombros, o terror noturno do envelhecer sem ruptura. a pele que vai se abandonando aos poucos, secando com as dezenas de anos empilhados pelo vento. a aurora que agora é fosca, todas as praias que já não são mais desertas, a capacidade da moeda de fazer tudo parecer importante. o consumo, sempre o consumo, o açúcar, o café, o cigarro. a dose no copo, o vício, a loucura e o arrependimento. tudo de novo, sem sequer haver sentido. o que se sabe, o que se viu e o que se estica como uma esteira sobre a areia branca, o mar poluído, as avenidas ensurdecedoras, absolutamente tudo é banal e banaliza os corpos. as possibilidades de mudança são escassas, a vertente da luta embandeirada virou piada, os corpos seguem amontoados e ainda estamos aqui, chorando a grande guerra enquanto as bombas explodem em nossos pés nas periferias do mundo. quem, afinal, seremos no findar do século: grão, poeira, semente estéril? um adeus profundamente triste, contingente de todas as explorações que agora suplicam piedade a robôs, também estéreis, que nos fazem desistir de nós. o excesso massificado, enlatado, plastificado. a toxina botulínica, o arrebatamento, as mágoas, tudo que se possa vender e dar desconto, o frete é grátis. a doença é psíquica e alucinante. como ainda podemos crer em algo depois de tudo?

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assumir-se

entre cheios e vazios

a que sou e odeio ser

a que posso ser

a que se veste pra sair

de uma vez por todas

admirar-se por apenas 

um instante ou letra morta

saber, enfim, um algo

que celebra a perda

escrever apenas, e renunciar

qualquer coisa

senão...

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deslocar-se entre si e as coisas

o tempo que se põe com o entardecer,

dissipando qualquer clareza sobre ser

um impulso, uma novidade ou um despertar

entre folhas verdes

secas de significados

apenas um existir

suave, indistinto, maturado

capaz de reivindicar-se

e, de si mesmo, experimentar 

cadência, zelo e dor

encontrar algo, enfim,

no que o desconhecido

ainda possa proporcionar.

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